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Foto do escritorLeonardo Ribeiro

A microbiota humana e sua relação com o desenvolvimento de tumores

Atualizado: 30 de ago. de 2021

Por Beatriz Nascimento e Leonardo Ribeiro



O microbioma humano consiste em um complexo ecossistema constituído por uma comunidade de microorganismos que sofrem constante influência de fatores genéticos, dieta e do meio ambiente. A composição dessa microbiota foi moldada durante milhões de anos de processo evolutivo tendo o sistema imunológico papel fundamental na promoção dessa complexidade e promoção do equilíbrio dessa íntima interação (Davenport et al., 2017; Mallott and Amato, 2021).

A microbiota é capaz de promover alterações nos mecanismos de proliferação e morte das células do hospedeiro, modulando a capacidade efetora do sistema imunológico e promovendo alterações no metabolismo de alimentos, bem como de agentes farmacológicos (Garrett, 2015). Diversos estudos têm demonstrado que a composição da microbiota intestinal tem um profundo impacto no desenvolvimento do processo carcinogênico e na modulação da resposta imune efetora contra tumores. Embora o câncer seja uma doença geralmente associada à alterações genéticas do hospedeiro e de fatores ambientais, estima-se que os microrganismos tenham participação em pelo menos 20% das doenças malignas em humanos (de Martel et al., 2012). Algumas bactérias, por exemplo, podem produzir substâncias e moléculas tóxicas que são carcinógenos em potencial; como a peptidil arginina desaminase (PAD), que está correlacionada com adenocarcinomas pancreáticos (Jacob, 2016; Öğrendik, 2015).

Figura 1. Relação entre microbiota intestinal, resposta imune e câncer

Bactérias já foram identificadas em tumores há mais de um século e se sabe que cada tipo de tumor possui uma exclusiva e diversificada composição populacional de microorganismos. Nejman et al. (2020), através da análise patológica de sete diferentes tipos de tumores sólidos, revelaram que LPS e rRNA 16S bacterianos estavam presentes no citoplasma e no núcleo de células, demonstrando que as bactérias intratumorais são majoritariamente intracelulares, sendo presentes nas células cancerígenas e também nas células imunológicas. De forma complementar, o desenvolvimento de novas tecnologias de sequenciamento do gene rRNA 16S acoplado à peptidômica de HLA permitiu caracterizar uma enorme variedade de espécies de bactérias associadas a tumores. Além disso, diferentes tipos de tumores têm distintas composições microbianas, sendo o microbioma do câncer de mama o mais diversificado. Essa abordagem tecnológica também evidenciou que peptídeos derivados dessas bactérias são processados e apresentados a linfócitos T de infiltrado tumoral através dos HLAs, modulando a capacidade efetora da resposta imune (Kalaora S, et al 2021).

Figura 2. Microbioma e imunidade

O maior entendimento sobre a estreita interação entre a microbiota e o desenvolvimento de diversos tipos de tumores nos leva a muitas questões sobre como essa relação afeta as estratégias atuais de terapias contra o câncer. Foi relatado recentemente que a eficácia da terapia anti-CTLA-4 é significativamente reduzida em camundongos tratados com antibióticos de amplo espectro. Além disso, a alimentação oral com Bacteroides fragilis em combinação com Bacteroides thetaiotaomicron ou Burkholderia cepacia aumentou a ação da terapia anti-CTLA-4, provocando uma resposta Th1 nos gânglios linfáticos e facilitando a maturação de DCs intratumorais (Sivan et al., 2015; Vétizou et al., 2015). Essas descobertas corroboram estudos paralelos no contexto do tratamento com bloqueio de PD-1 que demonstraram diferenças significativas no crescimento do tumor em camundongos geneticamente semelhantes com microbiomas intestinais diferentes (Routy et al., 2018). Essa abordagem também evidenciou que peptídeos derivados dessas bactérias podem ser apresentados via HLAs, e uma vez reconhecidos, alteram a capacidade efetora da resposta imune (Purcell et al., 2019).

É cada vez mais evidente que a microbiota representa um importante elemento nas estratégias terapêuticas anticâncer atuais. Adicionalmente, diversos grupos de estudo investigam o potencial terapêutico da manipulação da microbiota intestinal em pacientes com câncer, seja através da dieta (NCT02079662), uso de probióticos (NCT03072641), ou mesmo transplante fecal (NCT03353402). A composição da microbiota, por exemplo, pode indicar capacidade de resposta à imunoterapia ou ainda o prognóstico de sobrevida em determinados pacientes. Fato é que novos estudos têm apontado como fundamental o papel do microbioma no desenvolvimento de estratégias de imunoterapia mais eficazes.



Referências:





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